TEXTO: CONSTANCE ESCOBAR
FOTOS: SAMUEL ANTONINI

Oteque

Estive alguns pares de vezes no Epice, em São Paulo, restaurante que nos revelou o talento de Alberto Landgraf. Após dois anos de hiato desde o fechamento da casa paulistana, o cozinheiro reaparece no Rio de Janeiro, no comando do Oteque.

Se, na forma, o que vemos é a repetição de um modelo que se tornou comum na cidade — casa tombada em Botafogo, investimento milionário, reforma conduzida pelos mesmos arquitetos que já assinaram tantos outros projetos de restaurantes na Zona Sul —, no conteúdo o
Oteque voa alto.

Landgraf ressurge ainda melhor, mais livre, mais maduro. Seu novo projeto é uma aula do que pode ser — do que se espera que seja — um menu degustação. Pratos arquitetados com inteligência e aparente simplicidade, sem cair no lugar-comum nem abrir mão de algo
fundamental: o sabor.

Como a conclamar a cidade litorânea a retomar sua vocação, uma ementa em grande parte dedicada a peixes e frutos do mar revela precisão na execução (o ponto de pescados, carnes e vegetais é sempre impecável), sobriedade na escolha dos ingredientes e ousadia nos diálogos estabelecidos entre eles. Quanto mais arriscado esse diálogo, mais bem-sucedido parece o resultado.

Mais do que no frescor das ostras com maçã verde, é na surpresa das lambretas com leite de castanha-do-pará que se evidencia o talento do cozinheiro. Mais do que na delicadeza do sorbet de pera com ganache de chocolate, é na improbabilidade do encontro do milho-verde
com a tangerina que Landgraf faz diferença. Um dos melhores bocados experimentados nas visitas que fiz à casa, o boudin de foie gras com tucupi talvez sintetize bem a expressão de uma cozinha que se agiganta quando trafega fora da zona de conforto.

Mesmo quando mais ousa, o chef jamais vai além do necessário para expressar sua ideia. Com brilho, mas sem excessos, conduz o comensal com leveza e naturalidade, sem abrir espaço para que se entedie ou tenha a sensação de que comeu em vão.

OTEQUE
Rua Conde de Irajá 581 – Botafogo
(21) 3486-5758 | www.oteque.com

Nesta edição
RIO DE COSTAS PRO MAR
A cadeia do peixe no Rio de Janeiro
BACALHAU, O REI
Uma perspectiva histórica do consumo do peixe que é predileção mundial
CHÂTEAU RICHEUX
A cozinha corsária de Olivier Roellinger
D’ALGA
Produção de algas marinhas em ambiente controlado